domingo, 4 de julho de 2010

Trago-te na volta

Hoje ao fim da tarde fui correr. Gosto de correr sobretudo porque me liberto de tudo, sem telemóvel, carteira, relógio, nada, mesmo a chave de casa fica num ponto estratégico, vou só eu e a roupa. O impulso do tempo é por vezes mais forte e procuro horas num relógio vazio. Reajo ao barulho dos telemóveis com que me cruzo e variadas vezes jogo a mão ao bolso a pensar na chave. Demoro a conseguir limpar a cabeça dos objectos diários, pelo menos o primeiro quarto de hora em que o cansaço ainda não se apoderou de mim, depois a partir daí começo a pensar menos, o suor torna-se mais denso, o corpo entra noutra mudança, passo a render-me ao ritmo, respiração, esforço, com focar-me no meu objectivo para não me render à exaustão. Prefiro percursos com oscilações de caminho, alcatrão, terra, degraus, íngreme e plano, se não fôr assim aborreço-me e começo a pensar que me apetece fazer outra actividade qualquer. Hoje exagerei no grau de abstracção, mesmo com uma pedra no sapato não a tirei, não recuo perante as dificuldades. Eliminei toxinas, consolidei a minha resistência, aumentei o meu bem-estar, o mais difícil foi voltar para trás, ou bem que há uma barreira arquitectónica ou uma falésia ou quase me esquecia de que há um caminho de volta a percorrer.
A ida é quase insana, faminta, animal e conquistadora.
A volta é mais do mesmo, pesada, triste, desiludida e com uma pedra no pé.