terça-feira, 21 de setembro de 2010

Dar a felicidade ao purgatório

Esta noite sonhei que estava despido, os meus poros chamavam vorazmente o frio e nada mais que o frio a si, tortuosos. Eu gelado e tu sem pingo de vida à minha frente mas ainda assim mais quente que eu. Tu serena de olhos abertos e pousados num infinito maior que nunca tive capacidade de sequer idealizar, do qual me contavas coisas que nunca antes ouvira como reais mas que ansiava, para o qual me bastava ter sabido pegar-te na mão, umas vezes apertá-la e noutras confiar que me guiasses. Mas bati-lhe. Aguardei que perante a ameaça se curvasse ao domínio da força cega intransigente. Rebelou-se. Num lance rápido, mais que o que eu imaginaria possível e sem previsão, com a ajuda da mão livre, caiu decepada por um sabre aos meus pés assim que me libertei de uma mão moribunda ao primeiro jorro de sangue. Uma mão aberta que me teria amparado nas quedas e afagado o rosto ao final do dia, a mão que pousou no peito numa noite e me disse "juro que sou tua" a mão que me indicaria o caminho à felicidade, ali a perder-se da vida num chão onde antes dançáramos.

Nunca pensei... quando te dizia que te amava, desconhecia que sequer merecia dirigir-me a ti.

sábado, 11 de setembro de 2010

É areia quente debaixo dos meus pés

Arranquei-lhe menos que o que tinha para lhe dar. Deu-me, arrancados, uns minutos de uma vida que sonhara passada a seu lado. Não foram minutos, apenas o pareceram. A mim que ainda hoje acordo a ouvir-lhe os saltos atrasados para o trabalho. A mim que ainda sinto uma boca feliz de vez em quando, desiludida mais que o que reparara, ausente sem que lhe tenha percebido a partida. Talvez nem nunca tenha chegado, talvez estivesse ainda longe e logo a tenha espantado com este meio jeito de abrir caminho à catanada quando a ela se chegava através de indicações, subtis mas precisas, a um destino ao qual se chega sem esforço e sem suor.

(Deus, porque me fizeste assim? Porque me puseste a ser fogo quando me bastava ter sido água?)